A intervenção caduca
Demóstenes Torres
O mercado foi pego de surpresa por uma notícia grave durante a última semana: o ministro da Fazenda, Guido Mantega, teria se reunido com banqueiro para pedir a troca do presidente da Vale, Roger Agnelli. O vácuo de explicações logo após o ministro ser apanhado em flagrante é um claro sinal de que a mão forte da Presidência veste pelica quando o assunto são as trapalhadas dos aliados. Abriu os olhos quanto ao Irã, manteve-os lacrados quanto aos integrantes da equipe.
A manobra pueril do Palácio do Planalto mostra que, apesar do nono ano no comando do país, a turma ainda não compreende que são justamente as normas jurídicas as responsáveis pela manutenção da tranquilidade, do equilíbrio, desse conjunto de novidades que desde o início dos anos 1990 permite as conquistas políticas, sociais e econômicas. Solapando-as em busca de mais vaga para aplacar a sanha de cargos dos partidos da base, deslegitima-se o próprio governo.
A Vale é um exemplo de sucesso das privatizações, apresentadas a cada pleito para demonizar alguém. Apenas no último ano, a Vale ultrapassou a casa dos R$ 30 bilhões de lucro. É uma das maiores e melhores empresas do mundo. Se estivesse nas mãos do governo, possivelmente viveria em fundos de pensões, em vez de proporcionar-lhes benefícios. Portanto, o promissor para o País é o Executivo manter os punhos longe do que está dando certo sem ele. Fosse Roger Agnelli um mau administrador – e os relatórios, portanto, apontam o contrário –, bastaria que se convocasse uma assembleia de acionistas e sugerisse a troca do presidente. Ao optar por um caminho espúrio para atingir tal objetivo, o Planalto passa o carimbo de que as intenções da manobra são pouco republicanas. Falta-lhe o temor de comprometer investimentos privados para atingir metas próprias, abrindo precedente perigoso para a nação.
É calamitoso reconhecer que o governo quer fazer de uma empresa privada, novamente, parte do seu feudo. Resume-se a uma imitação patropi das lambanças protagonizadas pelo bufão cucaracho Hugo Chávez, que fez da Venezuela o protótipo do fiasco e era o espelho de Lula. A presidente Dilma Rousseff teve coragem de dar um chega pra lá no Irã, mas não demonstra o mesmo quanto à venezuelização branca do Brasil. O desfecho agora será o mesmo, indiferente da postura adotada pela empresa: caso opte por manter Roger Agnelli na chefia, poderá ser interpretado como uma retaliação ao desmando do governo, enquanto o inverso será apontado como um recuo da empresa. Nos dois cenários, quem perde é o Brasil.
Quando os bons ventos da privatização tiraram as empresas estatais das costas do povo brasileiro, o grupo hoje no poder fez tempestade em copo d’água, protestou, mas desde 2003 colhe os frutos desse acerto. Livrar-se do que não é atribuição de governo abriu caminho para a estruturação econômica do país. Foi o fim do patrimônio público a serviço de poucos, da mineração às comunicações, e o início da democratização da qualidade de vida para o brasileiro. O respeito às normas garantiu a confiança do mercado internacional e atraiu investimentos. Telefones deixaram de ser bens registrados em cartórios para finalmente se tornarem meio de ligação entre famílias nos pontos mais ermos do planeta. Empregos de Norte a Sul, industrialização, modernização e comércio forte foram resultados traduzidos em alimento na mesa da população carente, capital de giro nas empresas e o Brasil no colégio das grandes nações. Outros preferem chamar de liberalismo.
Respeitar a independência da iniciativa privada, incentivar o empreendedorismo, canalizar os recursos do governo para áreas vitais como a Educação são decisões que diferem um país sério, apontado como futura grande potência, de um arremedo terceiro-mundista. Retirar o manto protetor diplomático que encobriu as atrocidades no Irã foi um bom sinal. Pena que na mesma semana tenham se revelado mais Amadinejahs na Esplanada. A cada trapalhada do governo contra as liberdades democráticas o Brasil retomar o medo de ficar isolado no globo, culpando o capitalismo pela extinção da vida em Marte.
Demóstenes é procurador geral de Justiça e senador.
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